Invadiram-me sem cerimônia
aqueles olhos verdes
tristes e irrequietos...
que juro
nunca ter sentido num olhar
tanta doçura,
desejo
e afeto!
Amor de estações
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Chegaste como flor na primavera
Perfumando meu verso e minha vida
Era o início de uma nova era
Branca e singela como a margarida
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Veio o verão e o sol forte que era
Deixou nossa paixão mais aquecida
Eu dizia: Meu Deus que bom, quem dera
Que esse amor não tivesse despedida
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O outono, porém, veio a chegar
E nossas folhas ele ousou murchar
Faltou adubo para os corações
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E o inverno chegando em brisas calmas
Foi congelando aos poucos nossas almas
E o amor só durou quatro estações.
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Ao Duque
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Um recado a Osório Duque Estrada
Pois o hino da pátria está erraddo
Nosso povo não tem mais o seu brado
E a luz do seu sol foi ofuscada
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A justiça sem clava é fracassada
Nosso povo está desencorajado
Foge à luta envergonnha o seu passado
Nossos bosques de vida não tem nada
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Só se vê na nação hipocrisia
Injustiça nós vemos todo dia
Se olharmos em volta este Brasil
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Mesmo assim ainda amo a minha terra
Grito forte em planície, monte e serra
Que és amada entre outras terras mil.
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Antonio Marinho do Nascimento é natural de São José do Egito, Pernambuco, terra da poesia. Descende de uma forte linhagem poética: filho de Zeto e Bia Marinho, neto de Lourival Batista, bisneto de Antonio Marinho, sobrinho de Otacílio e Dimas Batista, e de Graça Nascimento e Job Patriota, alguns dos maiores repentistas brasileiros. Quem poderia ter sangue mais nobre? Aos dezesseis anos (2003) lançou seu primeiro livro - Nascimento - do qual extraímos estes sonetos. A foto acima está na capa do livro citado.
AMOR NO ÉTER
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Adélia Prado
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Há dentro de mim uma paisagem
entre meio-dia e duas horas da tarde.
Aves pernaltas, os bicos mergulhados na água,
entram e não neste lugar de memória,
uma lagoa rasa com caniço na margem.
Habito nele, quando os desejos do corpo,
a metafísica, exclamam:
como és bonito!
Quero escrever-te até encontrar
onde segregas tanto sentimento.
Pensas em mim, teu meio-riso secreto
atravessa mar e montanha,
me sobressalta em arrepios,
o amor sobre o natural.
O corpo é leve como a alma,
os minerais voam como borboletas.
Tudo deste lugar
entre meio-dia e duas horas da tarde.
Adélia Luzia Prado Freitas (Divinópolis, 13 de dezembro de 1935). Nas palavras de Carlos Drummond de Andrade: "Adélia é lírica, bíblica, existencial, faz poesia como faz bom tempo: esta é a lei, não dos homens, mas de Deus. Adélia é fogo, fogo de Deus em Divinópolis".