terça-feira, 15 de abril de 2014

Sonetos de Jorge de Lima

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Pelo silêncio
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Pelo silêncio que a envolveu, por essa
aparente distância inatingida,
pela disposição de seus cabelos
arremessados sobre a noite escura;
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pela imobilidade que começa
a afastá-la talvez da humana vida
provocando-nos o hábito de vê-la
entre estrelas do espaço e da loucura;
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pelos pequenos astros e satélites
formando nos cabelos um diadema
a iluminar o seu formoso manto,
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vós que julgais extinta Mira-Celi
observai neste mapa o vivo poema
que é a vida oculta dessa eterna infanta.

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Soneto da Saudade
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Quem não canta?Quem?Quem não canta e sente?
-Chama que já passou mas que assim mesmo é chama…
A saudade, eu a sinto infinda, confidente.
Que de longe me acena e fascina e chama…
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Mágoa de todo o mundo e que tem toda gente:
Uns sorrisos de mãe… uns sorrisos de dama…
…Um segredo de amor que se desfaz e mente…
Quem não teve? Quem? Quem não os teve e os ama?
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Olhos postos ao léu, altivagos, à toa,
Quantas vezes tu mesmo, a cismar, de repente
Te ficaste gozando uma saudade boa?
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Se vês que em teu passado uma saudade adeja,
-Faze que uma saudade a ti seja presente!
-Faze que tua morte uma saudade seja!
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Homenagem à ARLENE MIRANDA



(Arlene Miranda, retratada por Dydha Lyra)


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Retrato desbotado
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Arlene Miranda
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Abrindo, hoje,
o baú das minhas recordações.
Encontrei o teu retrato,
Já roto, desbotado,
Corroído por traças endoidecidas
Que tudo destroem com o passar do tempo,
Tornando as imagens da vida desvanecidas
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Teu semblante ainda é o mesmo
Mas o teu olhar não parece frio
Como Atualmente,
Ao experimentares os desencantos
Dos sonho perdidos,
Quando sentes o peso dos anos já vencidos...
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Olhando, agora, o teu retrato,
Vêm-me à memória
Ternas lembranças de um amor ardente
Que floriu a minha mocidade;
Um passado, no qual vi caminharem
As minhas ternuras, esperanças e alegrias.
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E nesse emaranhado de recordações
Volta a desfilar a tua presença
Viva, feliz, cheia de emoções.
Presença que, hoje, é apenas uma sombra,
Sombra que assunta um coração que chora
E que busca o passado no fundo da memória.
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                                          (Recife, dezembro de 1959)
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Arlene Miranda, jornalista, escritora e poeta, falecida em 26.12.2013, era membro da Academia Maceioense de Letras e do Movimento da Palavra. Foi a primeira jornalista profissional do Estado de Alagoas.

Poema de Cavalcanti Barros

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O Mar
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Não permitas
a tua amada
oferendar
desejos ao mar.
Eles não voltam
verde-vestidos,
se não, o que seria do mar?
Não deixes
teu poeta
fecundar o mar.
Seu corpo volta,
mas a alma fica
a cortejar o mar.
Se não, o que seria do mar?
As almas dos poetas,
como as dos pescadores,
vestem
verde-esperança.
Há blocos 
de almas verdes
no alto-mar.
Vagando, vagando
sem sul e sem norte,
sem ser, sem não-ser,
no conter do mar.
Se não, o que seria do mar?
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Copyright © 1988 by Cavalcanti Barros
All rights reserved.

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José Cavalcanti Barros é membro do MOVIMENTO DA PALAVRA